A alimentação está cada vez mais em desacordo com os objetivos climáticos. As emissões de gases com efeito estufa provenientes da produção de alimentos, – principalmente da carne, laticínios e arroz – irão, por si só, quebrar o principal objetivo internacional de não deixar que o aquecimento global ultrapasse um aumento de 1,5°C em relação ao século 19, se não forem controladas. O alerta faz parte do “Future of Food 2023”, estudo sobre o futuro da alimentação global, realizado pela Backslash, centro de pesquisa e tendências culturais da TBWA, coletivo global com mais de 305 agências em 98 países diferentes.
O relatório destaca o uso de inteligência artificial para descoberta de ingredientes sustentáveis, a mentalidade de sobrevivência como motivação para cultivar seus próprios alimentos, a interação na gastronomia requintada, entre outros fatos que impactam o meio ambiente e detalham a experiência do consumidor na indústria alimentícia. “A alimentação, atualmente, é um elemento fundamental na forma como o ser humano se relaciona com o planeta e com diferentes culturas, mantendo vivos diversos costumes e heranças”, afirmou Marco Sinatura, Chief Strategy & Innovation Officer da iD\TBWA, agência que combina dados, criatividade e inovação para desenvolver plataformas de crescimento para os seus clientes.
Para além da estética
Na avaliação do executivo, “é extremamente importante que as marcas, ao desejarem buscar ascensão e se manter em relevância, estejam alinhadas com a forma como as pessoas consomem seus produtos, pensam a respeito do setor no qual estão inseridas e em como isso afeta a relação delas com as empresas. A pesquisa é uma ferramenta muito útil para guiar esse caminho” Segundo ele, uma expressão que cresce cada vez mais e que, provavelmente, todos já ouviram falar é o adjetivo “Instagramável” para se referir a elementos que ficam bons em fotos compartilhadas nas redes sociais – e, no caso das comidas, não é diferente. “Muitos chefs de cozinha estão se adequando a esse cenário, entretanto, o estudo do grupo TBWA notou outros pontos que cresceram juntos a essa busca estética. A primeira questão abordada pela pesquisa observa a preocupação com o impacto ambiental gerado pelo alimento”.
Para Marco, “existe um desejo de olhar para a comida como uma fonte de bem-estar e isso vai desde a questão estética até sentir que se está fazendo algo positivo pelo planeta, sem o sentimento de culpa. Há um claro desejo de equilibrar necessidades coletivas e desejos individuais de uma forma que se adeque à maioria das pessoas, e isso afeta demais o consumo geral. Nesse sentido, nos últimos anos, segundo um estudo da ADM’s Brad Schwan, quase dois terços dos consumidores passaram a comprar de marcas que revelam mais do que apenas ingredientes e informação nutricional. E a preocupação vai para além do rótulo: quase um terço dos consumidores globais (30%) optou por boicotar uma marca alimentar devido às suas credenciais éticas. Além disso, os direitos dos trabalhadores são também uma prioridade crescente, já que 40% afirmam buscar marcas que tratam os agricultores e os produtores de forma ética”.
Respeito e experiência
Além do impacto ambiental, o relatório também notou forte preocupação com a origem cultural dos pratos, respeitando tradições e julgando representações vazias. Nesse sentido, chefs de cozinha e criadores de conteúdo estão sendo cada vez mais criticados por não reconhecerem devidamente as origens culturais das receitas. Isso ao lado de outra tendência que é a busca ativa por experiências alimentícias que alteram o papel do cliente, saindo de um simples consumidor para uma função mais ativa. “O Yelp, empresa voltada à avaliação de estabelecimentos comerciais, relatou uma explosão de novos conceitos de restaurantes experimentais, e, em 2022, houve um aumento de 75% nas aberturas de cafés temáticos e de 200% na inauguração de clubes de jantar”, lembrou Marco.
A dificuldade de abastecimento durante a pandemia é uma das fontes dessa nova tendência, que vem promovendo um perfil mais auto suficiente de público. “As idas aos restaurantes diminuíram significativamente, logo, as pessoas querem experiências diversificadas ao saírem de casa. Nesse cenário, uma alternativa para as marcas do setor, indo além das experiências interativas, é adotar um perfil de professoras desses consumidores que estão embarcando no universo da gastronomia. Num futuro em que cada vez mais pessoas adquirem os seus próprios alimentos, isso pode ser uma alternativa para se destacar no meio”, destacou o executivo.
Alimentação saudável e precisa
De acordo com a sondagem, a soma da busca por bem-estar ao interesse por saber mais sobre os alimentos resulta também em um novo padrão de consumo. Para além das dietas e da simples preocupação entre a quantidade de comida, de calorias e o peso da balança, cada vez mais as pessoas estão buscando rotinas alimentares personalizadas de acordo com seus biotipos.
Desde a perda de peso até o aumento da imunidade, a nutrição tem sido historicamente relacionada à melhoria da saúde física. Entretanto, um número crescente de estudos tem mostrado que existe ligação entre o intestino e o cérebro, dando aos alimentos um novo papel na promoção do bem-estar mental. “Isso promove um padrão de consumo alimentar muito mais preciso, relacionando a comida com o objetivo a ser alcançado, não apenas fisicamente, mas também mentalmente”, completa Marco.
Cozinha e tecnologia
Alimentos criados em laboratório, receitas criativas com o auxílio de IA e otimização das sobras. Após décadas de resistência, a tecnologia está sendo vista como a chave para um futuro alimentar mais inteligente, com menos desperdício e extremamente criativo. De acordo com Marco, “a influência dessa tecnologia é inegável, e se tornou pauta de diversas conversas também neste setor. E se engana quem pensa que essa discussão fica restrita ao universo cibernético: os novos programas de IA estão se mostrando como verdadeiros parceiros para aqueles que desejam se aventurar no universo da culinária”.
Metodologia
A pesquisa faz parte da série “Future of”, que acompanha as categorias mais relevantes de acordo com o interesse do público e qual o possível caminho que cada uma delas vai seguir pelos próximos anos. Com o auxílio de mais de 42 empresas participantes e o apoio de mais de 15 escritórios da TBWA, os estudos buscam entender e antecipar mudanças para auxiliar seus clientes a se prepararem para o futuro. Nesse levantamento, os respondentes trazem a experiência de seus trabalhos com algumas das maiores empresas de alimentos do mundo – como McDonald’s, Pladis, Albert Heijn, Lipton, Kibon, Alliz e Mondelli.